Peniche e o GSSP da Ponta do Trovão


GSSP do Toarciano
GSSP do Toarciano
Ponta do Trovão
Peniche


Praia do Abalo
Praia do Abalo (Peniche)


A Península de Peniche é um local venerado pelos amantes da geologia. A sua paisagem magnífica muito apreciada pelos turistas, comporta uma sucessão de camadas rochosas que foram formadas ao longo de -/+ 20 milhões de anos.

Estes estratos são o resultado da transformação de sedimentos em rochas, ao longo de milhares de anos. As argilas deram origem aos argilitos, as areias aos arenitos, alguns calcários foram formados pela acumulação de conchas e carapaças de organismos marinhos, mas outros há que se formaram em condições especiais que propiciaram a formação de calcite.


Formação de Lemede
Alternância de camadas de calcários e margas que compoêm a
Formação de Lemede


Os sedimentos que deram origem às rochas que se podem observar por toda a Península de Peniche, foram depositados numa posição horizontal, os mais antigos a serem sempre sobrepostos por sedimentos mais recentes.
As camadas de rochas que hoje se apresentam expostas, foram inclinadas por forças tectónicas muito depois da deposição dos sedimentos, o que permitiu que possamos usufruir não só da beleza que conferem à paisagem mas também do conhecimento sobre a história geológica que elas encerram.


Formação de Vale de Fontes em Peniche
Os estratos da Formação de Vale de Fontes em Peniche


O estudo aprofundado das rochas permite determinar, por exemplo, qual o tipo de sedimentos que lhe deram origem, o ambiente em que foram formadas e a sequência de deposição.

Independentemente da sua idade, quando um conjunto de rochas estratificadas com propriedades semelhantes, se diferencia das rochas que lhe servem de base e das que lhe estão sobrepostas, é classificado como uma unidade litostratigráfica cuja unidade fundamental é a Formação.


Praia do Portinho da Areia do Norte
Estratos da Formação de Lemede
entre a Praia do Portinho da Areia do Norte
e a Ponta do Trovão


Em Peniche estão identificadas várias unidades litostratigráficas ou seja várias Formações: Coimbra, Água de Madeiros, Vale de Fontes, Lemede e Cabo Carvoeiro.
De todas elas, a Formação do Cabo Carvoeiro é a única que só ocorre em Peniche sendo que as outras ocorrem em outros locais como por exemplo em São Pedro de Moel e Coimbra onde registam os seus locais-tipo. 


camadas sedimentares Peniche
As camadas cinzentas escuras da Formação de Vale de Fontes
dão lugar aos calcários amarelados da
Formação de Lemede


É por vezes muito difícil para nós Humanos, compreendermos a imensidão do tempo geológico. Reconstruir a História do nosso planeta através da composição das rochas e dos fósseis que nelas se encontram, é uma tarefa que está em contínua actualização à medida que vão surgindo novos dados. 
A idade das rochas pode ser determinada através do seu conteúdo fóssil, ou por outros métodos como a datação radiométrica e a magnetostratigrafia.


península da Papôa
A península da Papôa
é formada por estratos da Formação de Coimbra


Em Peniche, as camadas de rochas mais antigas encontram-se na Papôa, um dos locais mais visitados e hoje muito flagelado e desfigurado pelas "mariolas".
Estes corpos rochosos pertencem ao Sinemuriano - o segundo Andar do Período Jurássico.

Andar é a unidade base da cronostratigrafia e o seu nome termina em “ano” ou “iano”, neste caso Sinemuriano. Um andar inclui todas as rochas formadas nesse determinado tempo geológico.

Quando se pergunta a idade das rochas de um determinado andar, pois bem, será o tempo que foi necessário para que a sedimentação que deu origem a estes estratos rochosos ocorresse.
O Sinemuriano, de acordo com a Tabela Cronoestratigráfica Internacional está compreendido entre 199.3 ±0.3  e 190.8 ±1.0 milhões de anos.


Papôa Peniche
Papôa


A sequência deposicional exposta na península de Peniche apresenta várias unidades  litostratigráficas (Formações) depositadas em vários andares (unidades cronostratigraficas) do Jurássico inferior. 
A Formação de Coimbra que aflora na Papôa depositada ao longo do Sinemuriano, a Formação de Água de Madeiros que abrange o final do Sinemuriano e parte do andar seguinte - o Pliensbaquiano, as Formações de Vale de Fontes e Lemede também pertencentes ao Pliensbaquiano  e por fim a Formação do Cabo Carvoeiro do Toarciano, o último andar desta época do período jurássico.


Mas como é definido o limite entre dois andares? Com um bom apuramento dos dados litológicos e magnetoestratigráficos e com um abundante conteúdo fossilífero é possível estabelecer o limite inferior de um andar.  A esse limite é dado o nome de estratotipo-limite


Ponta do Trovão  vista da Praia do Abalo
A Ponta do Trovão
vista da Praia do Abalo


Em Peniche, mais precisamente na Ponta do Trovão, o topo da Formação de Lemede apresenta uma sucessão de camadas com cerca de um metro de espessura às quais foi dado o nome de Camadas de Transição (Couches de passage).
Estas camadas representam uma evolução progressiva da sedimentação e contém um enorme registo bioestatigráfico, não só de amonites, mas também de outros organismos como belemnites, nannofósseis calcários, ostracodos, e braquiópodes, que possibilitam uma datação precisa.


camadas de transição GSSP Toarciano
As camadas de transição
(couches de passage)
no topo da Formação de Lemede


A última camada desta sequência apresenta uma associação característica de amonites (Dactiliocerátides) que é universalmente interpretada como um marco para o inicio do andar Toarciano.

Locais como este, onde é possível estabelecer a passagem de um andar para outro, são escolhidos pela ICS (Comissão Internacional de Estratigrafia) para representar o estratótipo global desse andar que passa a designar-se como GSSP (Global Boundary Stratotype Section and Point).


Ponta do Trovão GSSP
A base da camada 15e da Formação de Lemede
marca o inicio do andar Toarciano.


O GSSP do andar Toarciano, fora outrora atribuído a um local na zona oeste de França, mais própriamente na  Pedreira de Vrines perto da cidade de Thouars, que lhe deu o nome.

Em 2014, foi ratificado pela União Internacional de Ciências Geológicas (IUGS) com o apoio da Comissão Internacional de Estratigrafia e atribuído à Ponta do Trovão.


GSSP do Toarciano
O GSSP do Toarciano assinalada pelo Golden Spike


Amonites Ponta do Trovão
A variedade de fauna de amonites permitiu
uma datação precisa das camadas de transição

O Prego Dourado (Golden Spike) colocado em 25 de Julho de 2016 na base da camada de transição 15e, assinala a Ponta do Trovão (Peniche) como referência mundial formal para o limite Pliensbachiano - Toarciano (Toarcian GSSP, 182.7 ± 0.7 Ma) pela primeira ocorrência (FO) de amonites Dactylioceras (Eodactylites) simplex juntamente com Dactylioceras (Eodactylites)  pseudocommune e Dactylioceras (Eodactylites)  polymorphum.


Golden Spike Toarciano Peniche
O Prego Dourado colocado
na Ponta do Trovão em 2016
para assinalar o GSSP


Esta é apenas uma tentativa muito sumária de explicar a quem visita a Ponta do Trovão em Peniche e consegue detectar o Blue Spike, desculpem, Golden Spike, a razão daquele local ser um GSSP.






Bibliografia:

Base of the Toarcian Stage of the Lower Jurassicdefined by the Global Boundary Stratotype Sectionand Point (GSSP) at the Peniche section (Portugal)

The jurassic of the peniche peninsula (Portugal): Scientific, educational and science popularization relevance

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