Jazida de Equinodermes do Cabeço da Ladeira
Há cerca de 170 milhões de anos, grande parte da Europa ainda se encontrava ligada à América do Norte.
Entre a Ibéria e a Terra Nova, existia um mar pouco profundo de águas mornas e limpidas.
O clima era quente e húmido e a vegetação exuberante.
A pequena povoação de São Bento, no Planalto de Santo António, era na altura uma zona litoral com águas que não ultrapassariam um a dois metros de profundidade.
Na zona de maré, existia uma fauna abundante com inúmeras espécies de estrelas do mar, crustáceos, peixes, ouriços e lirios do mar, entre outros.
Mas algo acontecia súbita e ciclicamente neste ambiente idílico.
Tempestades repentinas, ou outros eventos de curta duração, soterravam a fauna desta região.
Tempestades repentinas, ou outros eventos de curta duração, soterravam a fauna desta região.
Os seus exemplares, incrivelmente preservados na rocha calcária, podem hoje, milhões de anos mais tarde, ser admirados na Jazida de Equinodermes do Cabeço da Ladeira - A Praia Jurássica.
Esta jazida, como tantas outras jazidas portuguesas, resulta da exploração de uma antiga pedreira, escondida no meio dos chousos (muros de pedra solta) e disfarçada pelo relevo esbranquiçado da paisagem do Planalto de Santo António, no coração do Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros.
Apresenta uma grande variedade de fósseis de invertebrados marinhos, maioritariamente moldes externos, mas em alguns deles o esqueleto interno ainda se encontra preservado.
A qualidade de preservação destes exemplares é relativamente rara a nível nacional e internacional.
A qualidade de preservação destes exemplares é relativamente rara a nível nacional e internacional.
É o caso de algumas estrelas do mar que apresentam excelente fossilização, podendo-se observar os ossículos e até partes da pele do animal.
Em vida, os ossículos que compõem o esqueleto interno destes animais, estão unidos por tecidos moles que, após a morte do animal, se degradam rapidamente.
Para que os ossículos não se soltem, é necessário que não haja acção bacteriana o que acontece se o organismo tiver sido rapidamente soterrado, diminuindo os níveis de oxigénio.
Muitos ouriços-do-mar (equinoides) apresentam ainda os seus espinhos articulados.
Mas é frequente encontrarem-se restos de ouriços espalhados por toda a jazida.
Os lirios-do-mar (crinoides) têm o corpo em forma de cálice, provido de braços que filtram os alimentos da água, e geralmente fixam-se ao fundo do mar por um pé flexível - o pedúnculo.
Após a morte, o esqueleto usualmente desmonta-se em múltiplos ossículos.
Mas na Jazida do Cabeço da Ladeira, um crinoide deslocou-se rastejando com os braços, arrastando o pedúnculo atrás dele, deixando o primeiro registo fóssil de locomoção para este grupo de animais.
Este crinoide deixou um rasto de locomoção registado na pedra |
Na jazida são também visíveis os vestígios de actividade de animais - os icnofósseis, formados quer na superfície, quer no interior do substrato.
Estes incluem trilhos de caranguejos e de outros crustáceos, pistas de gastrópodes e galerias de lagostins ou de lagostas, sendo que alguns dos trilhos de caranguejos e pistas de gastrópodes constituem dos mais extensos indícios de locomoção encontrados no registo fóssil dos invertebrados.
Trilho de caranguejo |
Trilhos tipo “Buldozer” atribuídos à locomoção de gastrópodes |
Trilho produzido por camarões |
O trilho da foto acima e de baixo, é produzido pelas impressões das patas torácicas (pereópodes) e pelo arrastar da cauda de um tipo de camarões - os axiideanos - na lama.
Estes camarões são activos durante a maré baixa, pastando as algas e bactérias que se desenvolvem na superfície do sedimento.
No Cabeço da Ladeira, estes trilhos são muitas vezes cortados por trilhos de gastrópodes,
o que indica que foram produzidos debaixo de água.
É possível também observar as marcas deixadas pela ondulação - as ripple marks, que se estendem por vários metros.
Marcas de ondulação |
Além dos equinodermes também se encontram bivalves, braquiópodes e outras "curiosidades".
Numa área com cerca de 2 mil metros quadrados, a jazida apresenta sete estratos calcários da Formação de Chão de Pias, com cerca de 170 Milhões de anos - Jurássico Médio (Bajociano superior), mas os vestígios fósseis encontram-se em somente quatro dessas superfícies de estratificação.
Devido ao seu grau e modo de preservação, à sua idade e raridade, à alta concentração de fósseis no local ( mais de 80 exemplares de equinodermes ), e à sua elevada importância científica, os Equinodermes do Cabeço da Ladeira , foram classificados como geossítio no Plano de Ordenamento do Parque Nacional das Serras de Aires e Candeeiros (PNSAC) em 2010.
Pelo que sabemos, em 2014, foram recomendadas pela Assembleia da República, medidas de protecção e valorização da jazida, e a ponderação da classificação desta como Monumento Natural.
O Instituto de Conservação da Natureza desenvolveu um projecto com vista à musealização do local, criando condições de visitação de modo a permitir o acesso e a observação dos exemplares fósseis e das estruturas sedimentares no seu local de origem, por parte do público.
No entanto, até à data, além de uma delimitação deficiente do percurso sobre a laje que se limita a ladear alguns exemplares e de um painel explicativo à entrada, muito resumido e já muito desbotado, não há sinalização, nem explicação, nem protecção, nem museu que explique ao público o que realmente está a ver.
Mas para tentar preservar a integridade dos fósseis, recolheram-se exemplares para outros locais e, nos mais instáveis, foram desenvolvidas "acções de estabilização ou consolidação" ...
Equinóide Heterocidaris sp. nov. com espinhos articulados que possivelmente foi sujeito a acção de consolidação |
CLIQUE na imagem acima e veja o video desta Jazida no YouTube
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